04 novembro, 2007

Histórias sem fim

Ele assume pedir dinheiro para comprar cachaça. Me chama de riquinho, afirmando que mora na rua e lembrando que o filho da puta do seu irmão vive muito bem em uma bela casa da Zona Sul. No mesmo momento, seus olhos começam a chorar, e da sua boca que segura um cigarro amassado começa a escorrer uma baba asquerosa.

Depois disso, nunca mais tive notícias dele. A cerveja acabou e fui embora. Talvez nossas vidas voltem a ser encontrar. Afinal, o cenário de nosso primeiro contato é de freqüência constante de ambos.

O outro aparentemente só queria entrar de graça no cinema. Afinal não tinha dinheiro, mas deve ter ser lembrado que certo dia alguém disse que todos devem ter acesso à cultura. Estava descalço, sem camisa, com uma bermuda encardida que lhe deixava com um cofrinho que causava grande ojeriza ao ser observado. Seus trajes nada tinham a ver com aqueles que pagaram para estar ali, que com uma expressão de susto e até um pouco de medo olhavam quando educados brutamontes bloqueavam sua entrada no mais glamorouso espaço cinematográfico do Brasil. Vendo esta cena, uma jovem de classe média, daquelas que aparentemente se preocupa com o social, aproximou-se do homem para saber se estava tudo bem e lhe ofereceu sua garrafa de água. Para não fazer desfeita ele aceitou, mas assim como outro, a cachaça seria seu único conforto. Ao rapaz que estava do lado da boa menina, ele pediu um cigarro. Seu pedido foi realizado. Depois disso sumiu na escuridão das ruas. Sabe se lá para onde. Sabe se menos ainda se algum dia voltará.

Já o terceiro não chorou nem se revoltou. Em comum com os outros dois, apenas a vontade de tomar uma cachaça. Para conseguir, optou pela estratégia de fazer com que as pessoas achassem graça de sua situação. Começou dançar de forma realmente cômica uma musica que provavelmente nunca tinha ouvido. Após sua apresentação para o público, foi a cada grupinho que o cercava em busca do cachê de seu show. Ao chegar a minha roda de amigos com um sorriso de orelha a orelha, sua mão contabilizava 70 centavos, mas nada pagamos pela sua apresentação. Observei que ele conseguiu mais alguns trocados, e depois assim como os outros, tomou seu rumo e sumiu do meu campo de visão.

Na volta para casa, meu corpo optou por fechar os olhos. A única coisa que me recordo e de um caminhão pegando fogo. Um burburinho feito pelas cinco pessoas presentes naquele ônibus acordou-me para observar as labaredas. Fora isso, só a poluída a favelada aparência da Avenida Brasil.

Finalmente cheguei a minha casa. Finalmente essa história chega ao seu fim. E assim como quase todas as outras que assisti nesta noite, não possui um final e um propósito bem definido. Já que todos eles não me deram final a suas histórias, me vejo no direito de não escrever nenhum final para vocês.

João Gabriel Henriques